Da crise emergiu um gigante
Uma mudança e tanto. O processo de estagnação da economia brasileira foi tão longo que só agora uma geração inteira está conhecendo as benesses de uma expansão duradoura. Em qualquer setor que se analise, em qualquer segmento social que se comparem os números, em quase todos os indicadores, o saldo é extremamente positivo. Peguem-se, por exemplo, as exportações do agronegócio brasileiro. Em apenas oito anos, a venda de produtos para o Exterior pulou de US$ 24,8 bilhões para os atuais US$ 73 bilhões. Assim como o volume de financiamento destinado à agricultura familiar, que saiu de R$ 2,19 bilhões em 2002 para R$ 16 bilhões este ano. O computador pessoal já está presente em mais de 35% dos lares brasileiros, enquanto há oito anos não chegava a 15% deles.
Essa numeralha à qual são tão afeitos os economistas, analistas e estudiosos do desenvolvimento serve para traduzir de forma lógica um sentimento que não é palpável, quase abstrato até, mas que está presente de norte a sul do País. Pela primeira vez em décadas, o brasileiro está mais confiante com seu futuro, está mais feliz e, por mais controverso que isso possa parecer, está realmente se sentindo menos vira-lata em relação às nações com pedigree. Estivesse vivo hoje, é provável que Nelson Rodrigues voltasse ao tema e, quem sabe, decretasse o começo do fim de um complexo que ele traduziu com maestria no já longínquo ano de 1958.
Os frutos que estão sendo colhidos agora começaram a ser plantados há mais de um década e meia, ainda no governo do ex-presidente Itamar Franco. É indubitável a importância do Plano Real para o ciclo de desenvolvimento que o Brasil vive neste momento. Sem a estabilidade econômica conquistada a partir de 1994 – e o consequente controle da inflação –, pouco do que se comemora hoje seria possível. “Com inflação não se planeja nada. O sistema financeiro não dava crédito, olhava só para o dia seguinte e nós brincávamos que o longo prazo era uma semana”, conta Cristiano Souza, economista sênior do banco Santander. Os oito anos do governo de Fernando Henrique Cardoso, castigado por sucessivas crises econômicas internacionais, mostram que o processo de solidificação do plano foi difícil e custoso ao País. Para conseguir manter a inflação em taxas “aceitáveis” – inferiores a dois dígitos –, FHC precisou atuar com uma taxa de juros que quase sempre esteve acima dos 20% ao ano, causando prejuízos graves ao setor produtivo brasileiro. Fernando Henrique Cardoso foi muito criticado, principalmente no seu segundo mandato, mas é indubitável também que seu compromisso com a estabilidade da moeda e sua preocupação fiscal criaram um ambiente propício para as profundas mudanças que o País acompanharia nos dois governos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Em 16 anos tivemos apenas três ministros da Fazenda, quando o tradicional era termos um a cada semestre. Isso mostra a estabilidade que o País conquistou”, diz Sardenberg, da Febraban.
O grande mérito de Lula, talvez, tenha sido a forma responsável com que tratou as conquistas de seus antecessores e principais adversários políticos. Ao contrário de outros momentos da história política brasileira, seja em tempos de democracia, seja em tempos de absolutismo, Lula não tratou de desconstruir o passado para criar um futuro a partir do zero. Aproveitou-se da estabilidade econômica herdada de Fernando Henrique Cardoso para, aí sim, dar início a uma estratégia de desenvolvimento poucas vezes utilizada por aqui. Ao ir contra a máxima de esperar o bolo crescer para depois repartir, Lula jogou fermento na economia brasileira. Ao iniciar o longo caminho da distribuição de renda com programa sociais acusados de assistencialistas, como o Bolsa Família, conseguiu injetar dinheiro em camadas da população que viviam absolutamente à margem da economia. Além disso, trabalhou de forma árdua para uma valorização real da renda do trabalhador brasileiro.Foi uma mudança sem precedentes e o resto é história.
Um país pronto para se tornar potência
A esperança agora é de que o Brasil de 2010 não tenha o mesmo futuro daquele de 1958, quando Nelson Rodrigues nos diagnosticou com o tal complexo de vira-latas. Como agora, o País vivia uma época de euforia. Foi um ano em que os brasileiros acreditaram estar entrando, enfim, na tão esperada modernidade. As fábricas cuspiam para as ruas o DKW-Vemag, que com suas 50% de peças nacionais mostrava a capacidade da indústria brasileira. Oscar Niemeyer começava a tirar do papel as curvas de concreto que deram forma a Brasília e João Gilberto, pela primeira vez, mostrava ao mundo aquela batida única, exclusiva, só dele, que viria a revolucionar toda a música brasileira. Este ano que acaba agora não tem, nem de longe, o glamour, a leveza e a fantasia que envolveram aquele finalzinho da década de 50.
Mas não tem também as raízes de uma escalada inflacionária e da dívida externa que iriam levar o País à bancarrota anos mais tarde. E nem as sementes de um processo conservador que desaguariam em um golpe militar violento. Ao contrário de 1958, 2010 não se encerra como um ano em que, de uma hora para outra, as esperanças de um país melhor surgiram trazidas por um grande salvador prometendo mudar tudo e todos. A grande diferença é que desta vez o processo de desenvolvimento é gradual e, ao que tudo indica, está calcado em alicerces firmes. Mas nem tudo é alegria. A outra grande diferença entre esses dois períodos marcantes da história brasileira é que o meio campo da seleção que disputou a Copa do Mundo da Suécia contava com Didi e Pelé, enquanto a de 2010 teve Júlio Baptista e Felipe Melo.
Saturday, January 1, 2011
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